PL 3664/2025 e a política RenovaBor: o que muda para a borracha natural brasileira?
Projeto de Lei 3664/2025 institui a Política Nacional de Produção Eficiente da Borracha Natural, com foco em sustentabilidade, indústria nacional e créditos de descarbonização.

PL 3664/2025 e a política RenovaBor: o que muda para a borracha natural brasileira?
No dia 31 de julho de 2025 a deputada federal Marussa Boldrin (MDB/GO) apresentou na Câmara dos Deputados o Projeto de Lei nº 3664/2025, que institui a Política Nacional de Produção Eficiente da Borracha Natural (RenovaBor). A proposta marca mais um passo no reconhecimento da heveicultura como atividade estratégica e complementa a Política Nacional da Borracha, aprovada recentemente. O PL ainda aguarda despacho da Presidência da Câmara, mas já desperta expectativas entre produtores, beneficiadores e indústria por trazer um arcabouço de incentivos, metas e instrumentos financeiros voltados para a sustentabilidade e a competitividade do setor.
Por que a RenovaBor é necessária
A borracha natural é matéria‑prima essencial em indústrias como pneus, eletrodomésticos, equipamentos de saúde e vedações, mas a oferta doméstica brasileira enfrenta desafios de produtividade, de rastreabilidade e de volatilidade de preços. Ao considerar o látex como ativo estratégico, o RenovaBor pretende:
- Reconhecer o valor econômico e ambiental da borracha natural – o PL enquadra a borracha entre os ativos de interesse nacional, aproximando‑a de outras cadeias sustentáveis.
- Promover produção sustentável – a ficha de tramitação do projeto destaca entre os temas indexados a produção sustentável, indústria nacional e mercado de carbono. Isso indica que o texto deverá prever práticas de manejo de seringais que reduzam impactos ambientais, aumentem a produtividade por hectare e valorizem a proteção das florestas nativas.
- Fomentar a industrialização local – segundo a indexação, haverá foco no incentivo à indústria nacional, o que poderá incluir políticas de preferência para produtos de borracha natural doméstica, apoio a parques industriais e estímulos a encadeamentos produtivos.
- Garantir previsibilidade para investimentos – a proposta responde a demandas de entidades como APABOR e ABRABOR para que haja segurança regulatória, acesso a crédito e incentivos fiscais que viabilizem a expansão de seringais e o desenvolvimento de novas tecnologias.
Principais instrumentos previstos
Embora o texto integral do PL ainda não esteja disponível para consulta pública, a justificativa e a ficha de tramitação apontam alguns instrumentos previstos:
- Ações governamentais de fomento – o projeto envolve a criação de programas de apoio com linhas de financiamento, capacitação técnica, pesquisas em clonagem e manejo, além de incentivos à mecanização e ao cooperativismo. Espera‑se também apoio a programas de extensão para pequenos produtores.
- Inserção no mercado de carbono e créditos de descarbonização – um dos pontos mais inovadores é a previsão de que a cadeia da borracha participe do mercado de Créditos de Descarbonização (CBIO), instrumento já utilizado pelo programa RenovaBio. Segundo a B3, cada crédito representa uma tonelada de CO₂ evitada ou removida da atmosfera e pode ser negociado na bolsa para compensar emissões de empresas ou governos. Em 2025, o volume financeiro das negociações de CBIOs somava R$ 2,88 bilhões e mais de 21 milhões de créditos, o que mostra a maturidade desse mercado. Ao trazer a borracha para esse ambiente, o PL abre a possibilidade de remuneração adicional aos produtores que adotarem boas práticas de carbono e rastreabilidade.
- Integração com contratos digitais e rastreabilidade – inspirada em ferramentas já utilizadas em biocombustíveis, a RenovaBor deverá exigir o registro de produção via coordenadas geográficas, permitindo rastrear cada etapa da cadeia. Essa abordagem facilita a emissão de CBIOs, combate o desmatamento e favorece exportadores que precisam comprovar origem sustentável.
- Criação de um selo RenovaBor – embora ainda não oficial, discute‑se a gências de sustentabilidade, garantindo premiação de preços e acesso preferencial a programas de compras governamentais. de um selo de conformidade para produtos e beneficiadores que atendam às exi
- Incentivos fiscais e tributários – a política poderá contemplar redução de impostos sobre insumos, equipamentos e materiais de cultivo, além de regimes diferenciados para exportação de borracha certificada. Espera‑se também a revisão de alíquotas para importação de látex para não prejudicar a indústria local.
Benefícios esperados
Sustentabilidade e ganho ambiental
A adoção de práticas de manejo regenerativo em seringais (como uso de espécies clonais adaptadas, rotação de culturas e conservação do solo) reduz desmatamento e emissões. Ao converter emissões evitadas em CBIOs, os produtores passam a monetizar esses benefícios ambientais. A expectativa é que, ao longo da próxima década, a RenovaBor gere um estoque significativo de créditos de carbono provenientes da cultura de seringueira, contribuindo para as metas climáticas brasileiras.
Competitividade e inovação
O incentivo à indústria nacional pode estimular a fabricação local de pneus, luvas, preservativos e outros artefatos, reduzindo a dependência de importações e agregando valor à matéria‑prima. A exigência de rastreabilidade e o acesso a contratos digitais poderão modernizar a comercialização, diminuir fraudes e proporcionar transparência aos compradores internacionais.
Valorização social
A heveicultura envolve pequenos agricultores, assentados e comunidades tradicionais. Com apoio técnico e financeiro, esses grupos poderão profissionalizar a produção, obter certificações e se inserir em cadeias de valor mais complexas. Programas de capacitação, previstos no PL, tendem a melhorar renda e condição de vida.
Integração com outras políticas
A RenovaBor não surge isolada. Ela se soma à Política Nacional da Borracha — já aprovada —, que estabeleceu diretrizes para preços mínimos, proteção cambial e regulação de importações. Além disso, dialoga com o RenovaBio, que desde 2017 utiliza o mercado de CBIOs para incentivar o setor de biocombustíveis. Essa convergência de políticas coloca o Brasil em posição de protagonismo na economia verde.
Perspectivas e desafios
Apesar do otimismo, alguns desafios precisam ser enfrentados:
- Implementação e burocracia – transformar boas intenções em ações concretas exige coordenação entre ministérios, estados e municípios. O setor privado cobra que as regulamentações sejam claras e que a emissão de CBIOs para seringais não crie custos excessivos.
- Infraestrutura e logística – a maior parte dos seringais está em regiões com infraestrutura precária. Sem investimentos em estradas, armazenamento e processamento, a competitividade pode ficar comprometida.
- Preço da borracha – mesmo com incentivos, o valor pago pelo látex depende do mercado internacional, ainda dominado por grandes produtores asiáticos. A política precisa de mecanismos de proteção para que o pequeno produtor não abandone a atividade em momentos de queda de preços.
O caminho pela frente
A tramitação do PL 3664/2025 está no início. Após o despacho da Presidência da Câmara, o projeto passará por comissões temáticas (Agricultura, Meio Ambiente e Finanças) antes de ir ao plenário. Associações como APABOR e ABRABOR se mobilizam para aperfeiçoar o texto e incluir sugestões do setor. A participação dos produtores, técnicos e empresas será fundamental para que a lei reflita a realidade da cadeia e não se torne apenas um documento declaratório.
A Política Nacional de Produção Eficiente da Borracha Natural – RenovaBor representa uma oportunidade histórica de reposicionar a heveicultura brasileira. Ao unir sustentabilidade, inovação tecnológica, inclusão social e mecanismos de mercado como os CBIOs, o Brasil pode construir um setor mais resiliente, competitivo e alinhado às exigências ambientais globais. Para que isso aconteça, será preciso planejamento estratégico, investimentos públicos e privados, e comprometimento de todos os elos da cadeia. Fiquemos atentos ao andamento do projeto — e prontos para transformar essas diretrizes em realidade.
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